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domingo, maio 15, 2005

As Aventuras de João Sem Medo, uma das primeiras 

E de repente tenho 10 anos. Acordo com o cheiro a pão torrado em chapa de amianto e café de cevada acabado de fazer, numa cama improvisada do sofá forrado a vinil vermelho, muito em moda nos anos 70, presumo. É cedo, devem ser umas 7h da manhã. Sempre gostei destes dias de férias passados em casa dos avós. Ou avó...não consigo precisar se a esta altura já só era a avó...ou seria eu mais velho?

No final de tarde do dia anterior, o adorável banho de imersão com champô a cheirar a maçãs verdes. [Devia ter apontado o nome do champô, mas não fazia ideia que ia ter saudades daquele cheiro adocicado/ácido q.b., raios partam!] Aquilo era praticamente um sabor, caros leitores, se me aguçava o paladar...Provavelmente já nem existe aquela marca de champô, foi à falência com o surgimento de outras medíocres mas patrocinadas por gente bonita. Pena, coitados dos miúdos de hoje que não podem lavar o cabelo com o champô de que eu tanto gostava. O meu pai é adepto do Johnson's Baby, desde sempre. Não entendo como é que uma pessoa que cresce num sítio onde existe um champô daquele gabarito pode preferir o Johnson's....mas de resto, eu até gosto muito da água de colónia da Johnson's, por exemplo! Não me venham cá com merdas, "ah e tal mas tu nunca foste à bola com a Johnson's, por isso é que dizes que não presta"...calminha, eu até curto, mas em matéria de champô aquele das maçãs verdes era melhor...só isso.

À noite pedíamos uma pizza, eu guloso ao telefone a encomendar os ingredientes, e a minha avó risonha ia concordando com as minhas preferências. "Azeitonas, avó?". Pode ser...podia sempre ser. Ainda pode, tenho de aproveitar. Ir a Alvalade, pedir-lhe para tomar lá banho na banheira que entretanto encolheu, pode ser que ainda tenha guardado algum daquele champô nos armários, ou que saiba a marca pelo menos, e encomendarmos uma pizza com azeitonas.
Depois do telejornal, um pouco mais tarde, ficava só eu na sala, agora com a Ronda da Meia-Noite do Rembrandt ao lado, e aproveitava para rondar os canais nacionais na busca de um 007 ou de um filme qualquer que não fosse para a minha idade. Ia adormecendo e deitava-me sempre tarde, às vezes já no dia seguinte, muito tarde mesmo...

A alvorada era sempre presenteada com o cheiro a pão e café fresco, e com os bons dias da avó.
O dia era passado na loja do Poço dos Negros, depois de uma viagem de carro por caminhos que ainda hoje conheço mal. O Sala que não sai da telefonia. "Renascença Canal 1 é que é, o bom dia, o despertar...trá lá lá" e logo os comerciais que ainda hoje lembro tão bem "Bathroom, bathroom, mata moscas melgas e mosquitos, bathroom mata bem e mata mesmoooo". Grandes tempos!!! Áureos, grandes tempos áureos da mocidade.

Já procurei na net, não há vestígios deste Bathroom insecticida....desapareceu como as minhas memórias um dia, deixo-vos com este http://www.repeletron.com/, mandaram-me para o mail depois das minhas queixinhas de não conseguir dormir à noite com estas fêmeas fecundadas esvoaçantes. À semelhança do champô que não sei o nome, o insecticida publicitado no rádio ao som de uma musiquinha sublime desapareceu de tudo menos de dentro de mim...

...tenho reparado que algumas coisas começam a desaparecer à minha volta, ou que vão começar a desaparecer, e que, isso é que me assusta, desaparecerão inevitavelmente e irremediavelmente.

E de repente tenho 21 anos, acordo e vejo as horas, passei pelas brasas e deixei-me crescer.







[mas pouquinho, dizem-me agora]

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